Você conhece Arístocles, famoso atleta? Não? Então o apelido dele – que significa “ombros largos” – lhe deve ser bem familiar: Platão (428-348 a.C.). Pois é do autor dos Diálogos (26 capítulos, suma de sua obra) que se fala aqui, no caso de um dos mais célebres deles, A República.
O livro, dividido em dez partes, é uma pequena utopia, escrita entre 384 e 377 a. C. Na construção de um sistema ideal, Platão traça um paralelo político-moral. Para a classe à qual ele destina o poder supremo (magistrados e filósofos), a razão é a palavra-chave; para os que garantirão a segurança dessa república (os guerreiros), a coragem é a marca moral; para aqueles cujas atividades envolvem a produção e o comércio (artesãos, homens de negócios) são destinados os instintos básicos: a sensualidade, os apetites.
Essa utopia é severa. Sisuda, bem-comportada e exige que a educação encaminhe-nos para a bravura antes de tudo. Cuidado com os poetas, como Homero e Hesíodo. Poesia e música devem ser fiscalizadas. É um regime pesado, que oprime os ombros dos cidadãos que acaso sonharem com alguma liberdade (a utopia platônica é no mínimo polêmica, abolindo propriedade, casamento, os filhos sendo afastados das mães e educados pela comunidade; o Estado é o pai e todos os cidadãos formam uma única família).
No quesito educação, o que seria ensinado aos jovens, até os vinte anos, são a agilidade e o brio de um soldado e, por exemplo, em música, marchas militares estimulando a emoção patriótica.
Há contradições nessa utopia. Se os poetas dela foram banidos, Platão escreve como um poeta, e sua filosofia constrói antes por imagens do que por argumentos (sem falar da forma adotada, o diálogo, deliciosamente eficaz num gênero em regra sem sabor). Um dos momentos altos de A República é o livro VII, "A alegoria da caverna", onde prisioneiros numa gruta ignoram o mundo lá fora, confundindo as sombras projetadas no fundo com fatos e coisas reais.
Mas o tema central da obra é a justiça, como chegar a ela, sem a qual todo julgamento é falho e toda realidade fica sob suspeição. (30/08/2008)
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4 comentários:
Bem, isto, quer dizer... Como debater com quem acaba de acabar com Platão?! Bentancur, você é de fato corajoso, caro blogueiro. Não é por acaso que os temas da filosofia vão e vêm no seu blog. Você entende do riscado. E se arrisca. E, com você, ficamos na corda bamba, quase sem referência, já que você as rouba de nós. Embora nós dê outras. A começar, você mesmo.
Impressionante...
Glênio Farias (Taubaté, SP)
Prezado Bentancur: você sabe, Platão não é só isto. Há outros aspectos, e mais interessantes. A forma como ele descreve a vida do espírito é notável, insuperada até hoje. Pelo menos no plano literário, senão no filosófico. Mas seu alerta fica. Merece reflexão.
Beijo.
Sílvia Ramirez, Curitiba, PR.
E, justiça seja feita, né, Pauloooo, sem o Platão não existiria o Sócrates...
Ítalo C. Bianchini (Erechim, RS)
Paulo, Platão é imaginação e realidade. E a forma como ele transpassa a imaginação pela realidade expõe a forma de sua genialidade.
abração.
Jeff Negromonte
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