sábado, 21 de fevereiro de 2009

O PREÇO DA AMBIÇÃO

O empresário (palavra que neste caso exigiria um adjetivo mortal, que por decoro declino aqui de utilizá-lo) e ex-deputado Sérgio Maya, 66 anos, responsabilizado pelo desabamento de um condomínio – o Palace II, na Barra da Tijuca, Rio, em 1998 –, com a morte de 8 pessoas e 150 famílias (quantas pessoas?) jogadas ao desabrigo (não é outra forma de morte, sem nenhum exagero retórico aqui?), acaba de falecer, causa: infarto agudo. Isso ocorreu na madrugada de sexta-feira, dia 20, antes que sol raiasse como ainda não raiou para muitas dessas vítimas que esperam há onze anos – data da tragédia do Palace – indenizações que em sua maioria não ocorreram por alegação do sentenciado de que não possuía mais bens – arrestados – para pagar os estragos.

Maya morreu e isso nada representa. De bom, talvez, só o caso de que em Ilhéus, BA, onde se encontrava, não prosseguirá com seus planos de novas construções. Nesse tempo que passou, andou preso apenas alguns meses, foi solto, pagou algumas indenizações, teve bens leiloados (processo que se arrasta até hoje) para fazer frente às reposições de 120 famílias com ganho de causa. O percentual que viu a cor do dinheiro até agora foi ínfimo. O sujeito continuou a agir, inocentado diversas vezes e julgado outras tantas das irregularidades da construção (material de categoria inferior ao anunciado, para começo de conversa).

A saúde acusou o baque, claro. Se a justiça funciona mais ou menos (menos que mais), a do corpo é mais incisiva, e não quer nem saber. Ele carregava na alma esse peso de toneladas que acabaram por fim em derrubá-lo. Se por acaso não foi a consciência culpando-o, foi a própria ambição buscando salvaguardá-lo do que não podia salvá-lo jamais: ele próprio, destinado, pela trajetória, a implodir-se.

O velório é grande. Não de Sérgio Maya, onde palavras como dor, perda, lágrimas etc. nem passam pela cabeça de quem se debruça sobre a notícia, mas o de provavelmente mil pessoas ou mais, atingidas pela construção de um prédio que a Sersan – também com bens leiloados –, empresa que ele dirigia, como uma entidade abstrata perpetrou um dos grandes genocídios do final do século XX no País. Aquele tipo de genocídio que os responsáveis podem chamar de acidente, acaso, tragédia imprevista ou que expressão quiserem. Os únicos que estarão velando o corpo de Sérgio Maya. E, claro, algum familiar, com o mesmo sangue mas, espero, com outra noção de justiça e com uma ambição que não se alimente de vítimas mas das iniciativas responsáveis, cada vez mais raras, quase um milagre.

As vítimas do Palace II nada ganham com essa morte. Mas desconfio que ganham, e muito, prováveis futuras vítimas, uma vez que recentemente foram apontadas irregularidades até mesmo num projeto que Maya havia, duas isquemias depois, apresentado em Ilhéus para um Centro de Convivência para idosos na Praia de Cururupe. Mesmo à sombra da morte (que talvez ele não pressentisse), a ambição suplantava o passado, comprometia o presente e impedia o futuro. Que se foi embora mesmo. (21/02/2009)

3 comentários:

Anônimo disse...

Bentancur:

é isso aí. Esse já foi tarde. Aliás, tarde mais.


Brenno Alcides de Freitas – Rio de Janeiro, RJ.

Anônimo disse...

Paulo,


Uma vantagem esse Sérgio Naya tinha. É anti-ético falar de alguém morto. Mas, com tanta justiça, se falou horrores dele quando vivo, que agora, morto, só se pode mesmo coninuar a falar a mesma coisa. O cara fez estragos... O tema é importante, vale a reflexão da hora. É fato. Mas quando você volta a nos brindar com aquelas reflexões interessantes sobre o poder da leitura sobre nossas vidas? No que me diz respeito, tais pautas me permitem construir mais coisas. E que não desabam. Abraço.

Lucilena Pujol, São Miguel do Oeste, SC

Melissa disse...

nem tem muito o que dizer.