Querido Scliar,
eu poderia escrever para a tua família, tua esposa, teu filho, contando-lhes do meu imenso carinho por ti, da minha admiração incondicional, como artista e (o que é mais difícil) como o ser humano que foste. Mas preciso te dizer alguma coisa. Se não alcançares essas palavras, estarei, como consolo (embora nesta hora inconsolável) dizendo-as a mim mesmo. Tive as duas convivências contigo. Foste o escritor que a partir dos meus 17 (portanto, há 36 anos) passou a acompanhar a minha carreira, me estimulando sempre, me sugerindo, me aconselhando, me alertando, arregaçando as mangas (que energia, exército de um homem só!), ao ponto de escreveres dois generosíssimos prefácios em dois livros meus, ao ponto de eu ter a alegria de ter editado três livros teus, sem falar nas vezes em que nos cruzamos para dar palestras juntos, como em Santo André, SP, sobre o centenário de Erico Verissimo, em 2005, e tu te mostravas mais preocupado com a minha ansiedade do que com a palestra em si, tão generoso, meu amigo, meu irmão, quase um pai (dá licença, Beto!). Estamos órfãos, eu e a literatura. (27/02/2011)
domingo, 27 de fevereiro de 2011
quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011
TERRÍVEIS TARADOS E A REAÇÃO COMUM DAS MULHERES
Um homem, 35 anos, passa por uma mulher bonita, lá pelos seus 28, 30. Encanta-se. Controla-se até onde pode. E não vai além de cantarolar, emparelhando o passo quase ao lado dela, num trecho da calçada em que estão apenas ambos, e mais nenhuma testemunha para envergonhá-lo: "Você é linda, / linda demais. / Você é linda sim. / Esta canção / é só pra dizer / e diz..." Nem a observa, tenso, talvez. Embora com o encanto inquebrável. Até que... A mulher apressa o passo, como se corresse de um assassino e, cinco metros adiante, olha para trás, encara-o, pura fúria, encolhe os dedos e estica o indicador, dando o troco socialmente merecido: "vai tomar no teu cu!"
Outro homem, mais jovem, rapaz ainda, passa por uma adolescente de uns 16, 17 anos, e mais murmura que exclama, olhando sempre em frente: "Meeeeeeuuuuu Deuuuuussssss!" A jovem vira-se, como se abalroada por um búfalo, e vocifera: "Não te enxerga, ô meu?!"
Um homem de meia-idade, fazendo sua habitual caminhada, para próximo a uma dama distinta, idade similar, colar de pérolas e palavras secretas que ele supõe jamais um dia escutar. Comenta com a parceira na espera do demorado semáforo: "este cruzamento é chato mesmo..." Ela não responde, como se se fosse fazê-lo acabasse de assinar a própria sentença de morte. Ele ainda acrescenta, assim que o sinal abre e ela dispara: "Boa taaaaarde!". Ela segue quase correndo, tropeça, vira-se na direção dele e o olhar de puro desgosto acompanha a boca vomitando um "filho da puta, não respeita ninguém? Não se olha no espelho?" Ele, chocado, tem vontade de perguntar-lhe se ela tem alguma intimidade com a língua portuguesa. Mas sabe que a palavra "intimidade" poderia não pegar bem.
Um senhor septuagenário observa com indisfarçável alegria os movimentos de uma senhora sexagenária, vestido florido, coque no cabelo cinza mas tão docemente moderno. Ela dá o flagrante no olhar e sacode a cabeça, comentando com uma outra que passa: "esses velhos não respeitam ninguém...".
Um menino de uns dez anos examina artigos esportivos numa loja especializada. Uma menina da mesma idade gruda o olho nele e não desgruda. Ele não vê nada mais belo que o par de tênis, a caneleira, as luvas. Quando está saindo do estabelcimento com o pai, a menina arrisca: "Tchau!" E ele, sem saber que é a coisa mais natural do mundo, responde: "Tchau!". (23/02/2011)
Outro homem, mais jovem, rapaz ainda, passa por uma adolescente de uns 16, 17 anos, e mais murmura que exclama, olhando sempre em frente: "Meeeeeeuuuuu Deuuuuussssss!" A jovem vira-se, como se abalroada por um búfalo, e vocifera: "Não te enxerga, ô meu?!"
Um homem de meia-idade, fazendo sua habitual caminhada, para próximo a uma dama distinta, idade similar, colar de pérolas e palavras secretas que ele supõe jamais um dia escutar. Comenta com a parceira na espera do demorado semáforo: "este cruzamento é chato mesmo..." Ela não responde, como se se fosse fazê-lo acabasse de assinar a própria sentença de morte. Ele ainda acrescenta, assim que o sinal abre e ela dispara: "Boa taaaaarde!". Ela segue quase correndo, tropeça, vira-se na direção dele e o olhar de puro desgosto acompanha a boca vomitando um "filho da puta, não respeita ninguém? Não se olha no espelho?" Ele, chocado, tem vontade de perguntar-lhe se ela tem alguma intimidade com a língua portuguesa. Mas sabe que a palavra "intimidade" poderia não pegar bem.
Um senhor septuagenário observa com indisfarçável alegria os movimentos de uma senhora sexagenária, vestido florido, coque no cabelo cinza mas tão docemente moderno. Ela dá o flagrante no olhar e sacode a cabeça, comentando com uma outra que passa: "esses velhos não respeitam ninguém...".
Um menino de uns dez anos examina artigos esportivos numa loja especializada. Uma menina da mesma idade gruda o olho nele e não desgruda. Ele não vê nada mais belo que o par de tênis, a caneleira, as luvas. Quando está saindo do estabelcimento com o pai, a menina arrisca: "Tchau!" E ele, sem saber que é a coisa mais natural do mundo, responde: "Tchau!". (23/02/2011)
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